Indígenas se organizam e lançam 130 candidaturas em 24 estados

Ocacique xavante Mário Juruna percorria os gabinetes do Congresso e da Esplanada dos Ministérios em Brasília com um gravador de pilha nas mãos

Eleito deputado federal pelo PDT no Rio de Janeiro em 1982, o primeiro e único indígena a chegar ao Congresso Nacional dizia que não confiava no homem branco. Gravava as conversas com ministros e com seus colegas deputados para depois cobrar as promessas feitas por eles.

Hoje, 35 anos depois da eleição de Juruna, indígenas das mais diversas etnias se organizam com um objetivo claro: unir forças para conseguir eleger pelo menos um representante para o Congresso que tomará posse em 2019.

O número de candidatos que se declaram indígenas chegou a 130 nas eleições deste ano, número 50% maior do que nas eleições de 2014. Apesar do crescimento, ainda é uma parcela ínfima do total –0,47% dos 27,5 mil candidatos.

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Dos 130, nem todos têm necessariamente uma militância das causas indígenas. É o caso do general Hamilton Mourão (PRTB), candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro (PSL), que causou polêmica ao declarar-se índio na inscrição da Justiça Eleitoral –na pré-campanha ele afirmou que o país possui “uma herança da indolência, que vem da cultura indígena”.

Por outro lado, pelo menos 70 estão organizados em um grupo pluripartidário batizado de Frente Parlamentar Indígena. Eles mantêm uma ação coordenada e debatem por meio de aplicativos de mensagens online em seus telefones celulares.

A movimentação aconteceu num momento em que grupos conservadores ganharam maior protagonismo no Congresso e passaram a questionar pautas caras aos povos indígenas como a demarcação de terras.

“A conjuntura atual nos forçou a agir e buscar uma participação mais ativa nas eleições. Há um processo em curso para retirada de direitos dos povos indígenas”, afirma Valéria Paye, membro da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.

O principal nome lançado pelo grupo foi Sônia Guajajara, candidata a vice-presidente pelo PSOL na chapa encabeçada por Guilherme Boulos. Militante da causa indígena, ela faz parte do povo guajajara, que vive na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão.

A candidatura de Sônia é vista como uma vitrine para dar maior protagonismo ao debate das questões indígenas nas eleição deste ano e ajudar a catapultar os demais candidatos que disputam outros cargos em 24 estados.

“Precisamos de representantes que sejam uma voz legítima dos nossos povos. É claro que existem outros parlamentares que defendem nossas causas, mas não adianta. A gente sabe que nunca vai ser a prioridade”, afirmou Sônia Guajajara à Folha.

A maioria das candidaturas está concentrada nos estados do Norte. Em Roraima, por exemplo, são 18 candidatos espalhados por 11 partidos –do PCB, que apoia Guilherme Boulos, ao PTB, que se aliou a Geraldo Alckmin (PSDB).

Um dos nomes considerados mais competitivos é de Joênia Wapixana, 44, que é filiada à Rede Sustentabilidade e disputa a eleição para deputada federal por Roraima.

Primeira indígena a tornar-se advogada no Brasil, Joênia atuou na demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol e foi a primeira presidente da Comissão de Direitos dos Povos indígenas da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

No mesmo estado, Telma Taurepang (PCB) disputa uma cadeira no Senado. Mesmo em um partido pequeno, ela diz estar otimista em relação à eleição deste ano.

“Acredito que a gente vive um momento de mudanças, de inversão de valores. A população do nosso estado vai valorizar a candidatura de uma taurepang”, afirma. O povo taurepang vive numa região de tríplice fronteira entre o Brasil, Venezuela e Guiana.

Em Mato Grosso do Sul, Anísio Guató também disputa uma vaga no Senado pelo PSOL. Ele faz parte do povo guató, que por quatro décadas foi considerado extinto no Brasil, mas voltou a organizar-se em aldeias nos anos 1990.

Natural de Corumbá, na fronteira com a Bolívia, ele disputa este sua quinta eleição. Nunca foi eleito nem para vereador, mas não esmorece: “A luta pela mãe terra é mãe de todas as lutas. Não vamos desistir”.

O que propõem os presidenciáveis para os indígenas:

Lula (PT)

Adoção da paridade de gênero e de cotas de representatividade étnico-racial na composição das listas para enfrentar sub-representação de mulheres, indígenas, negros e negras” na reforma política (Genérica);

Promoção de políticas de igualdade racial (Genérica);

Demarcação de terras indígenas (Genérica).

Marina Silva (Rede)

Finalização dos processos administrativos das terras indígenas pendentes;

Criação de um Fundo de Regularização Fundiária para indenizar fazendeiros em terras indígenas a preços de mercado.

Ciro Gomes (PDT)

Regularização fundiária de territórios de comunidades tradicionais, quilombos, quilombolas e terras indígenas (Genérica);

Fornecimento de material pedagógico adequado para tratamento da questão racial nas escolas.

Guilherme Boulos (PSOL)

Pedido de perdão aos povos indígenas pelo etnocídio;

Reforço do orçamento da Funai para reconhecimento, homologação, demarcação e regularização imediata de todas as terras indígenas, quilombolas e das populações tradicionais;

Homologação das terras indígenas já identificadas, com os pagamentos indenizatórios cabíveis (tanto aos indígenas pela demora, como aos ocupantes não indígenas de boa-fé), beneficiando 125.574 indígenas;

Construção da primeira universidade indígena.

Vera Lucia (PSTU)

Regularização e titulação das terras indígenas e quilombolas (Genérica)

João Goulart Filho (PPL)

Garantia do direito a posse e uso da terra aos povos indígenas (Genérica)

Nenhuma menção:

Jair Bolsonaro (PSL)

Geraldo Alckmin (PSDB)

Álvaro Dias (Podemos)

João Amoêdo (Novo)

Henrique Meirelles (MDB)

Eymael (DC)

Cabo Daciolo (Patri)

Com informações da Folhapress

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